
Acenei para ele, tentando apaziguar sua vontade de adentrar a festa e, obviamente, roubar um copo de whisky. Sai esbarrando nas pessoas e pedindo desculpas, até que segurei o braço do meu pai e o conduzi para o elevador. Minhas lágrimas caiam silenciosas na bochecha rosada de blush enquanto ele dizia que eu era uma prostituta.
Entramos no carro e ele continuava a me perguntar coisas como “Está com a buceta ardendo?”. Sua direção era destemida, carregada de uma segurança que só pessoas alcoolizadas conseguem ter. Chegamos a casa, tranquei-me no quarto enquanto ele proferia impropérios atrás da porta, mencionando minha índole.
Aquela noite, minha mãe estava em viagem. Ela havia escolhido aquele homem para dormir e eu... Não escolhi nada daquilo. Eu tinha 14 anos e enquanto minhas amigas conversavam sobre namorados, eu estava preocupada em encontrar meu pai bêbado quando voltasse para casa. Não demorou muito para que eu não fosse convidada para algumas festas, já que o meu pai chegaria para me buscar cedo ou tarde, totalmente alcoolizado e dando um show básico.
Sempre invejei minhas amigas que recebiam telefonemas de amigos e ficavam horas a fio ao telefone em conversas descartáveis e risonhas ou, ainda, quando convidavam seus amigos para papear na sua casa. Nunca pude fazer isso, primeiro que se eu desse o telefone para uma amiga, prontamente meu pai a cumprimentava com qualquer frase asquerosa. E receber amigos em casa? Só se eu quisesse pagar um king-kong, afinal ele apareceria cheio de frases ofensivas ou, ainda, expulsaria a todos. E como agüentar aquilo se na casa dos meus amigos eu era tratada tão bem e gentilmente? Decidi que ninguém teria meu telefone nem saberia meu endereço.
E foi assim que depois de uns poucos anos, adoentada moralmente, que sai de casa. Há resquícios dessa agressão moral em mim ainda hoje. O alcoólatra adoece as pessoas a sua volta. Acredito que para ele seja mais fácil, afinal ele está encarando a realidade com aditivos no sangue enquanto você, vítima do alcoólatra, está sóbria e tão consciente da agressão que a injeção de realidade deixa suas veias doloridas.
Recebi tratamento psicológico no A.A. depois que deixei de ver meu pai e, por mais que dissessem que se trata de uma doença, que devemos assisti-los, abraçá-los e perdoá-los por armas colocadas na sua cabeça quando você só tem 12 anos de idade... Eu não consegui ser altruísta, lúcida e bater no peito para dizer “Eu o perdoei!”. O perdão não virá e eu já não me sinto culpada por odiar o sangue do meu sangue tão avidamente.
Nenhum comentário:
Postar um comentário