quinta-feira, 30 de outubro de 2008

A vida secreta das mães ou O desejo por um banho de verdade

Deve ser acordado entre as mães que não se revele às outras mulheres, sem filhos, o que se passa nos bastidores de sua vida. Não sei qual é a idade mais adequada para ser mãe, alguns preferem “realizar este sonho” depois da estabilidade profissional, outros (como eu) são assaltados com uma cara rechonchuda no monitor de uma ultra-sonografia. E alguns passam anos tentando e buscam, por fim, a ciência. E aí há uma enxurrada de vontades, métodos, assombros e medidas. Talvez se as mães tivessem me revelado METADE do que é ser mãe... Eu teria assumido o celibato, considerando que não há método 100% eficaz para evitar uma gravidez.

No dia do aniversário da minha melhor amiga, 11 de agosto de 1999, descobri que estava grávida (engraçado que sempre UM FATO, como a primeira menstruação, também aconteceu no aniversário da minha melhor amiga). Chorei, esperneei, voltei para casa a pé, me joguei na frente do carro e me vi no espelho repetindo: - Me diga o que você vai fazer da sua vida?

No dia que cheguei da maternidade, minhas amigas se acotovelavam na frente do meu computador para ler o que um garoto estava falando no mIRC (um programa de bate-papo) enquanto eu amamentava e rezava para que a dor no bico dos meus seios parasse. E se não cessasse a dor que, ao menos, os bicos dos seios parassem de sangrar. Mas não aconteceu, foram meses ouvindo a ginecologista dizer “Tudo bem, agüente só mais um pouco e logo seus seios irão se acostumar com a amamentação”. Pomadas e mais sangue. Meu filho deve ter bebido litros do meu sangue com leite. Mas, mesmo assim, eu não desisti de amamentar já que ele tinha cólicas homéricas com leite industrializado. E lá vamos nós.

Meu bebê dormia muito bem, mais de 8 horas seguidas. Tudo se devia a exaustiva sucção que ocorria durante a sua alimentação. Quando fui obrigada a diminuir a amamentação para assistir aulas, ele passou a ter um sono violento. Muitas vezes fui à aula com apenas 2 horas de sono dormidas. E daí eu ouvia a voz do professor como se fosse um quartel, ecoando de forma irritadiça nos meus tímpanos. Fui mandada embora algumas vezes da sala de aula por adormecer, sem controle, na cadeira da universidade. Outras vezes, preferi me ausentar por meus seios jorrarem leite, obrigando-me a virar a “garota camisa-molhada”, neste caso, “vaca molhada”.

Minhas amigas tinham desejos tórridos com o carinha do período anterior, enquanto meu sonho de consumo era dormir 6 horas ou comer à mesa, sem interrupções. Valores haviam mudado bruscamente, lembro de chorar exaustivamente na frente do meu filho quando ele me acordava às 4 da manhã para mamar. Com alguns meses, ele já bebera leite, sangue e lágrimas.

A minha rotina era deixar meu filho no berçário e ir à aula. Depois voltar para casa, esbaforida, ao meio-dia e buscá-lo para dar o seu almoço. Seguimos essa rotina até eu terminar a minha graduação, quando isso aconteceu meu filho tinha três anos de idade. E como toda criança de três anos, ele não parava um segundo quieto. Crianças nesta idade conseguem ser armas para elas mesmas. E, em consonância, eu tinha um trabalho de fim de curso para entregar. Vejamos, eu faria o trabalho enquanto ele estivesse dormindo e deixaria de dormir? Foi o que fiz.

E no dia que defendi meu trabalho, meu filho brincava com uma bola nos corredores da universidade e eu dizia para ele: - Brinca só aqui e não entra na sala! E ele brincou, expliquei todo o meu trabalho para uma banca, guiada pelos gritinhos do meu filho com a bola.

E depois de um dia assim, eu lembrei quantas vezes tomei banhos longos e falei ao telefone sem me importar com o tempo ou com uma tomada desencapada. Lembrei o que é ficar num salão de beleza sem hora para voltar ou papear com as amigas até perder a saliva.

Eu estava ali, precisava ser forte, pois diferente dos bebês de outras espécies, os humanos não sobrevivem sem alguém. E eu sabia que era tudo para alguém e que este alguém, encapetado e descontrolado, reafirmava minha fé na vida por mais destrambelhada que ela tivesse se tornado.

Já o levei para o hospital com uma cortina de sangue no rosto para levar pontos. Já andei metros com ele, bem pesado, nos meus braços porque havia cortado o pé. Já dormi dias num sofá de hospital. Já achei que meu filho teria sido seqüestrado para extração de seus órgãos porque ele resolveu brincar até tarde na casa de um colega sem avisar (Na verdade, achei isso mais de 3x). Já chorei todas as lágrimas inimagináveis até os meus 20 anos. São tantas emoções (voz do Roberto Carlos).

Toda vez que virem mulheres maquiadas com seus filhos pequeninos OLHEM para elas com MUITO RESPEITO. E eu devo ter esquecido de MUITAS coisas aqui. Deus deve não permitir que se divulgue O QUE É SER MÃE para que o mundo não deixe de sentir A VONTADE da reprodução.

Queridas, eu amo meu filho. Mas ser mãe é RENUNCIAR a si, de alguma forma.

Adendo: Meu filho hoje tem 8 anos. Tomei um banho de verdade quando ele tinha 4 anos.
Voltei a comer à mesa quando ele tinha 6 anos.

Esse post é dedicado a pessoa que quando chega da escola me faz lacrimejar, sem censura. Ao passo que ouço a minha voz, dengosa, pronunciar um “Você chegou, filho!”. Isso para mim é uma estranha felicidade. Uma felicidade clandestina que eu só poderia descrever com fatos triviais.




2 comentários:

  1. Maravilhoso o texto! Apesar de não ser mãe e ter a idade que você tinha quando engravidou, me emocionei, pois sei o que as mães são capazes por seus filhos. Descobri faz pouco tempo o site, mas já sou leitora de primeira ;)

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  2. Nossa, lendo seu texto me vieram lágrimas aos olhos... minha história é bem parecida... hj tenho uma filha de 1 ano e 9 meses, estou concluindo minha graduação em Direito e ontem a noite, mesmo, esperava ela dormir para escrever meu protejo de monografia.... tudo o que vc descreveu, todas as dores, todos os cansaços, tudo isso eu vivi e vivo ainda... dormir pouco, ir pro hospital com um bebe no colo com a cara rachada, bicos dos peitos sangrando, noites mal dormidas, banhos pela metade, almoços interrompidos, meodeos... a maior partes das pessoas nao veem, mas o q a gnt passa nao é fichinha! estudar, trabalhar e criar um filho e ainda fazer tudo isso com excelencia, convenhamos, isso é digno de mulher de verdade! por isso, nao discriminando qm nao tem filho, mas nós que temos é que realmente sabemos o valor de cada coisa a qual renunciamos por conta da maternidade!

    afinal, ser mãe é padecer no paraíso!

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